domingo, 14 de maio de 2017

Ser Mãe Invisível...

 Hoje dia das Mães... Me sinto na obrigação de dividir isso com vocês, pois creio veementemente que tudo o que eu passei não foi em vão e que posso ajudar outras pessoas.
Vocês infelizmente não olham em minhas redes sociais as peripécias da minha filha, as gracinhas, os delírios e angústias de ser mãe, a introdução alimentar, a interação na escola... mas aqui existe uma mãe!
Louca por sua filha e agarrada no que de mais maravilhoso ela me trouxe, no curto espaço de tempo que estivemos juntas fisicamente. E mais: no que ela continua me fazendo experimentar de bom, mesmo após sua partida. Por ela, acreditem, tento ser uma pessoa melhor. Por ela me reinvento todos os dias e busco ser melhor para as pessoas que estão ao meu redor, principalmente meu marido, meus pais, irmãs e sobrinhos. Por ela, escrevo esse texto hoje, pois sei que existem milhares de mães invisíveis como eu. E se eu puder alcançar um desses corações, eu já estarei mais do que satisfeita. Por ela tento alcançar vocês para tratarmos desse assunto, que ainda é tabu na sociedade.
Minha filha existiu, existe e continua a existir. Isso é fato. Talvez não palpável, mas é fato.
Volta e meia me perguntam se eu tenho filhos. Não hesito em responder: -tenho uma menina!  Vive no céu!
Se isso me deixa triste? Não mesmo!  Sinto-me feliz em poder falar sobre ela! Deixando os dissabores de lado, como sou especial por ter minha Letícia! Ela não é fruto da minha imaginação. Gerá-la foi a coisa mais maravilhosa que já pode acontecer na minha vida.
Então, meus amigos, neste dia das mães, peço a vocês um pouco mais de empatia com essas mães invisíveis, assim como eu.
O luto é singular e cada um o vive de forma diferente. De fato é muito difícil associar o começo de uma vida à morte. Não condeno ninguém por isso. Mas muitos casos ao nosso redor acontecem e precisamos enxerga-los. Deixem que essas mães vivenciem esse luto, mas não permitam que essas crianças morram na totalidade de sua existência. Elas continuam vivas e muito vivas. Falem delas, lembrem-se delas, chorem por elas. Elas não são frutos do imaginário de ninguém. Não são coisas que perdemos e passamos por cima, esquecemos.
Para mim, a Letícia continua mais do que viva... Ela me faz viva, por mais doloroso que seja não tê-la aqui.

Parabéns pra você, mãe que a mídia não mostra. Mãe que não aparece nos comerciais de tv e nos vídeos de homenagens que pipocam na internet nessa época do ano.
Parabéns pra você que recebeu, com um tapinha nas costas, um prognóstico médico de que seu filho não viveria até fazer 2 anos de idade.
Ou que, provavelmente, nunca falaria e nunca seria independente.
Parabéns pra você que ouviu do médico ou do psicólogo que seu filho estava assim por falta de estímulo dos pais.
Parabéns pra você que chorou escondido por meses, e até anos. Tudo para que seu filho não visse. Tudo para que o marido, que estava pior que você, não visse também.
Parabéns pra você que já ouviu centenas de vezes que seu filho fica muito tempo no tablet, e que você deveria incentivá-lo a se interessar por outras coisas. Como se você já não fizesse isso há anos, incessantemente, sem sucesso.
Parabéns pra você que escuta as pessoas se referirem à sua filha como “a que tem problema”.
Parabéns pra você que escuta dos outros que é “especial” e “escolhida por Deus”, como se isso fosse algum prêmio de consolação.
Parabéns pra você que ouviu, de várias escolas e de várias formas diferentes, que elas não querem o seu filho.
Parabéns pra você que acabou de descobrir que o coleguinha de sala da sua filha fez uma festa de aniversário e só ela não foi convidada.
Parabéns pra você que escuta a amiga contar todas as peripécias do filho de 5 anos, que já sabe o abecedário em 3 idiomas. Você lembra que seu filho ainda usa fraldas e nem sequer fala, engole a própria tristeza, força um sorriso e diz “estou tão feliz por você!”.
Parabéns pra você que suporta o olhar penetrante do outro toda vez que seu filho faz um barulho estanho na rua. Que suporta o olhar recriminador do outro cada vez que ele tem uma crise. Que escuta outras crianças comentarem “papai, por que ele baba?”.
Parabéns pra você, que leva o seu filho ao playground, vê as outras crianças saindo e escuta “vamos embora porque chegou o esquisito”.
Parabéns pra você que vê todos os vídeos de apresentações de Dia das Mães das suas amigas no Facebook, pensa que, talvez, nunca verá seu filho falar um simples “eu te amo”, rola a página e segue a vida.
Parabéns pra você que não pode ficar velha, doente, com depressão. Porque seu filho depende totalmente de você. E vai continuar dependendo mesmo depois de adulto.
Parabéns pra você, mãe de uma criança negra, que a vê passar exatamente pelo que você passou: sofrer racismo diariamente na escola, na aula de balé, na loja do shopping.
Parabéns pra você, mãe e mulher negra, que já ouviu várias vezes que sua filha é “exótica”.
Parabéns pra você que vê seu filho chorar e dizer que tem o cabelo “ruim”.
Parabéns pra você que a mídia não mostra. Que não aparece no comercial bonito feito pra chorar no Dia das Mães.
É difícil ser qualquer uma dessas mães.
Mais difícil ainda é ser uma criança “diferente” em um mundo que não inclui, não aceita e não abraça a diversidade.
Andréa Werner



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